Dia dos pais - a reflexão por trás do marketing

Entra ano, sai ano e nos deparamos com praticamente o mesmo calendário editorial de datas para empresas. Salvo exceções de cada mercado, com datas especificamente relevantes para um e não para outro, as datas principais e mais importantes são as mesmas e o dia dos pais é uma delas.

Apesar de 2020 ter tido um dia dos pais fora do comum devido à quarentena de 2020, uma coisa não mudou, o esforço de marketing por trás das promoções das empresas em torno da data e sabe o que mais?
A repercussão delas nas mídias sociais. 


Vem conferir!! 
Natal, dia das mães, dia dos namorados e dia dos pais, qualquer pessoa que trabalhe com marketing ou no comércio sabe a relevãncia das 4 datas comemorativas mais importantes do ano e planeja suas estratégias e esforços de venda para as datas, às vezes até 1 ano antes. 

A cada ano temos propagandas diversas com o intuito de chamar a atenção, despertar a emoção, motivar as compras/vendas, fidelizar, reter e conquistar novos clientes, assim como vemos empresas envolvidas em polêmicas, seja por ser inovadora ou por "dar um tiro no pé." 

A marca do ano foi a Natura.


CAMPANHA PAIS PRESENTES DA NATURA

A campanha #PaisPresentes da marca, contou com Thammy, já conhecido por todos.

A primeira estratégia da marca aconteceu no dia 23/7, quando Thammy postou em seu intagram um vídeo brincando com o filho de 6 meses com a hashtag da campanha, o que bastou para os ataques começarem. 


Um dos responsáveis por fomentar o ataque, foi o também já conhecido Silas Malafaia, que se disse indignado pela escolha da marca de colocar "uma mulher para representar um pai no dia dos pais, contrariando os valores das famílias cristãs que são maioria", de acordo com suas prórpias palavras. 

Bastou alguns dias e a proximidade da data para o assunto inundar todas as mídias sociais, principalmente Twitter e Linkedin. 


A REPERCUSSÃO DA CAMPANHA DO DIA DOS PAIS DA NATURA NAS MÍDIAS SOCIAIS

Enquanto no Twitter usuários davam sua opinião, em sua maioria a favor da marca, no Linkedin os comentários eram, em sua maioria contra, sob a justificativa de que a marca deve conhecer o seu público e evitar polêmicas. 

Dados os fatos, vamos à minha opinião como profisisonais de marketing: "De que vale sermos os primeiros a levantar as bandeiras de igualdade sempre que uma causa é levantada se não podemos de fato abraçar as causas e defendê-las sempre que necessário sob o pretexto de nos mantermos longe de polêmicas, não é mesmo?"


HOMEM TRANS EM UMA CAMPANHA DO DIA DOS PAIS FOI UM ERRO?

E para quem ainda acha que a Natura não conhece o seu público, ela conhece sim. Eu mesma fui revendedora Natura por alguns anos e sabe o que viamos nas reuniões? MULHERES!!
Em 99% das reuniões o público era 100% mulher, e muitas delas, mães, que revendiam Natura para complementar a renda da casa, porque o marido/pai das crianças estava desempregado, se sentia envergonhado de fazer "bicos", ou simplesmente não ajudava na criação dos filhos por "N" motivos... 

Pois é, mulheres conversam...
Meses de pensão atrasada, quando a mãe/revendedora sabia o paradeiro do pai que deveria ser tão responsável pelo sustento dos filhos quanto ela... Mas já reparam o quanto o abandono parental é aceito? Ou o "aborto paterno"... 

E sabe o que vi "de montão no Twitter", muitos homens que reclamavam do Thammy na campanha da Natura, sendo confrontados pelos filhos e suas mães sobre a pensão atrasada, sobre ser o #paipresente que a campanha da Natura propôs e que Thammy é, enquanto isso no Linkedin, mais uma vez o buzz em torno do "quem lacra não lucra" aumentava e a frase voltou a ser vista aos montes, até que, nos dias 29 e 30, a Natura viu suas ações subir 10,09%, chegando a R$ 48,67. No dia 29, a alta foi a maior da Ibovespa, na casa dos 6,7%. 

A CAMPANHA DO DIA DOS PAIS COM O THAMMY FEZ AS AÇÕES SUBIREM? 

Com certeza não sozinha, o início da recuperação da bolsa como um todo nesses mais de 100 dias de quarentena e o investimento constante da Natura em desenvolvimento e inovação contribuiram, mas uma campanha ousada e ao mesmo tempo tão condizente com os valores que alega ter, não poderia ter repercussão diferente. 

A maior parte do público da Natura, inclusive eu, ex revendedora e consumidora na Natura, apoiamos a campanha, e como profissional da área passei a admirar a marca ainda mais. Ter coragem de apresentar a realidade como é e trazer a inclusão de verdade para a marca. 

A primeira campanha de dia dos pais com um homem trans, nem precisou de fato acontecer em grandes proporções e rede nacional para trazer a tona discurssões tão pertinentes e que, se você, já buscou um pouquinho que seja sobre a data nas mídias sociais nesse dia, também já deve ter visto. 


ATÉ AONDE AS MARCAS REALMENTE ABRAÇAM AS CAUSAS?

Além das falsas afirmações de aceitação diversas de pessoas e empresas que na primeira oportunidade critica a empresa que realmente tentou quebrar barreiras que vão além de um textinho boinito sobre inclusão e trazer o tema à tona em uma das datas mais importantes para o comércio, vemos a realidade de mães solos no Brasil e filhos abandonados financeiramente e afetivamente por seus pais ao mesmo tempo que se critica tanto um homem tras ser chamado de pai.


ALGUNS DADOS SOBRE PATERNIDADE NO BRASIL:

O número de mães solo no Brasil saltou de 10,5 milhões para 11,6 milhões no período de 2005 a 2015. Os dados são do mais recente censo feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 

Das famílias comandadas por mulheres, 56,9% vivem abaixo da linha da pobreza. O número de crianças que sequer têm o registro do pai na certidão de nascimento já soma 5,5 milhões. Os números estratosféricos ficam ainda mais críticos ao pensar que cada uma dessas mães faz um malabarismo absurdo para conseguir cuidar dos filhos e da casa, fazendo, muitas vezes, tripla jornada de trabalho para compensar o rombo no orçamento familiar. Ainda mais agora, com essa pandemia de mudanças, crianças em casa, escolas fechadas, aumento do trabalho doméstico, poucas formas de lazer para entreter as crianças e descansar/divertir os adultos...

Para piorar, muitas delas simplesmente não contam com a tão falada rede de apoio. Um levantamento feito pela ONG Rede Nossa São Paulo apontou que 33% das mulheres que moram na capital (o que corresponde a 1.219.438 mulheres) cuidam sozinhas dos filhos. E assim, a maternidade, que naturalmente já impõe muitos desafios às mães, pode ser ainda mais cruel com as mães solo. 

Fora as famílias que sofrem com pais "presentes" mas que mantém uma relação tóxica em casa, de todas as formas imagináveis...

 
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BOM INÍCIO DE SEMANA A TODOS 💓💪🏽 VAMOS VENCER!

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Mais uma vez impossível não levantar as falhas da sociedade patriarcal em que ainda vivemos, onde o machismo impede a aceitação de um homem trans em uma campanha de dia dos pais mas considera normal os dados acima, a ponto de ainda julgar as mães que se dizem cansadas, que exigem que os pais sejam mais presentes, que fazem questão de receber suas pensões e que tentam tirar um tempo para se divertir ou tentam se destacar em suas carreitas para dar o melhor para seus filhos ou ainda as mulheres que optam por não ter filhos. 

Assunto que eu a Ariany comentamos um pouco, inclusive, no podcast abaixo:


Caso o player acima não funcione,  CLIQUE AQUI PARA OUVIR.

E a pergunta é?
ATÉ QUANDO?

Até quando vale post bonitinho sobre inclusão e diversidade desde que de forma genérica para não "prejudicar a marcar"? 
Até aonde vale ir em prol do lucro, reafirmando preconceitos velados?
Até quando aceitar o errado porque já é cultural será o certo? 

Qual a real responsabilidade de todos nós como profisisonais de marketing/prograganda/publicidade, comerciantes, consumidores... enfim, pessoas?

São reflexões que ficam por trás do marketing deste e de muitos outros dias dos pais e datas comemorativas em geral, que já passaram e que ainda virão.
Este ano, foi um pai, homem trans, no dia dos pais. 
E tem a discursão de sempre se deve-se ou não parabenizar mães no dia dos pais...

Mas também já teve reclamação por ter casal LGBTQIA+ no dia dos namorados...
Ou a surpresa por ver uma família negra em um comercial e vermos ser forçado o "racismo reverso" por isso...

Quando na verdade o real questionamento é: estamos realmente livres dos preconceitos? 
Porque essas campanhas ainda causa tanto buzz?

Até quando vamos sofrer por bulling e discriminação de forma tão explícita e violenta, que leva a morte de pessoas todos os dias, pessoas negras, mulheres, LGBTQIA+, etc...




Até a próxima
Th@is
💋




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